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quarta-feira, 19 de março de 2025

Cabo de guerra


Nos últimos tempos, a frase do Guimarães Rosa “o que era isso, que a desordem da vida sempre podia mais do que a gente?” ecoa com muito barulho dentro de mim. Depois de um ano inteiro de fracassos retumbantes, de muito pouco e nada, de desesperos que mesmo quando eu tenho o dom de explicar só faziam sentido pra mim decidi que era a hora de colocar os pés no lugar onde minha vida acontece e obrigar alguma coisa acontecer. 

Diferente de 2021, parece que não restou nenhum filho bom da dor. Não estou mais corajosa, tampouco consigo ver beleza o tempo todo nos momentos de paz, ainda que eu me force e seja assustador admirar a diferença entre a cabeça que pensa e o saco plástico.

Fui esperta, acreditei na vida, consegui ver mais alegria no cuidado de quem se importa do que encarar a angústia de perceber que algumas relações que eu nutria tanto sentimento viraram só eu em um barco remando com uma venda nos olhos pronta para uma guerra pelas delícias do sentir. Ainda que todos os dias alguém bata nas portas do meu coração dando notícias de que meu afeto é caro e que sou sortuda para além da vida adulta. 

Vi pedra, não sabia onde estavam as flores, tive medo da morte e não pelos meus pais mas porque temi que eu realmente deixasse de existir. Chorei pelos meus filhos, pelo amor da vida que se eu morro hoje fica sendo quem não foi.

Mas acreditei. Sozinha, perdida e confusa passando um brilho na cara e me obrigando a sentir. Em um cabo de guerra comigo e algumas das pessoas mais especiais do mundo acreditando que a vida presta e eu também. Algum anjo esbelto deve me ver e pensar que posso ter mil defeitos e as vezes não ter saúde mas ninguém pode dizer que eu não tento que a vida entregue estrela.

De alguma maneira, em meio a tanto sono, comprimidos e travesseiros cheirando a cama de hospital brota em meu peito uma fé na vida que me acompanha desde sempre e quem desde abril de 2022 deixei na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro e que inevitavelmente um dia voltarei para buscar. 

As vezes dar conta é não morrer e não se amargurar com a falta, ouvir minha mãe cantar esperando que eu complete a música, que meu pai se anime em me ver conversar com alguém, confiar no que entrego, sentir medo e ir com medo mesmo, e que se eu talvez não consiga ajudar mais passarinhos caídos do ninho, como no poema da Emily Dickson, tenho certeza que se eu fizer que na Vida alguém esqueça a Dor ou a Aflição não viverei em vão.

quarta-feira, 3 de abril de 2024

Foi o que ela disse

 


Faz muito tempo que eu não escrevo aqui, comecei esse blog com 14 anos porque sempre fui viciada em sentimento mas na verdade eu nem sabia direito o que era gostar de alguém. Sei que pela brevidade do nosso encontro você deve me achar maluca por ainda tocar nesse assunto passado mais de um ano.  Eu não sei se você ainda se lembra dos detalhes mas a consideração que você teve e ainda tem por mim, de não ter me tratado mal mesmo quando eu estava maluca e era um pouco a Kelly com dificuldade de gerenciar o departamento que era só eu e até merecia que você me falasse algumas verdades, do tipo que eu não era ninguém pra te cobrar nada. Que você não assinou nada pra levar um fardo depois de dois encontros. Mas você nunca o fez, me acolheu, me acolhe, me escuta. Você me curou do medo de me envolver sem nem saber disso porque hoje eu acredito que o cuidado é possível, mesmo quando me quebraram lá atrás me tirando a chance de acreditar que a consideração pode permanecer. Outro dia você me disse que eu não te conhecia tanto e eu sinto muito por isso, queria te conhecer mais, mas o que eu conheço admiro muito e é bonito saber que é isso que fica pra sempre. Você me modificou sem saber e isso é suficiente para eu te colocar todos os dias nas minhas orações e meus desejos mais bonitos. Me perguntei por muito tempo porque me apaixonei mesmo com nossas diferenças latentes, mesmo com alguns desencontros, mesmo com pouco ao vivo. E a resposta que cheguei é que seu jeito de me tratar e me valorizar me lembraram que eu existo. Não sou mais apaixonada porque o tempo passou mas eu gosto tanto de você que as vezes me lembro como eu achava legal pensar que podíamos ser meio Jim e Pam. Mas calma, está tudo bem, eu sei que meu sofrimento diante da sua impossibilidade te assustou e te fez mal me ver sofrer. Por aqui tá tudo bem mas ainda me lembro a alegria de entrar no seu coração e te fazer acreditar que querer cuidar de você foi a força que me fez ter vontade de estar melhor. Te admiro e te agradeço por graças a você eu acreditar que a consideração ainda existe. Nada muda isso. Não sei se vou te mostrar esse texto mas eu desejo e torço pra que se qualquer dúvida pairar na sua cabeça, que você se lembre do privilégio que é ser gostada por você. Que você é um amigo incrível, um bom filho. Um coração bonito além do sorriso que sempre me arrebatou. Fecho meus olhos e lembro de ouvir o Don L cantando "me faz acreditar" te vendo fumar na janela do quarto enquanto eu ria e dizia que ia sair correndo se alguém viesse xingar a gente. Eu não sabia ali que era uma mensagem do futuro pra mim, você existir me faz acreditar. É a melhor coisa que alguém pode fazer por mim. Obrigada por existir. Não deu para ser a sua Pam, mas a Karen também foi legal, né? Mesmo por pouco tempo, só de ter acontecido é muito. Vida longa aos teus sonhos e sorrisos.

terça-feira, 11 de abril de 2023

Fundando as estruturas



 Recomecei. E da altura dos anos que eu tenho medo de encarar posso dizer que aprendi que é o meu superpoder: levantar e recomeçar. A menina de 14 anos que escrevia nesse blog ia ficar impressionada ao saber que encarei sozinha uma viagem de 10 horas de ônibus entre dois Estados em que eu não conhecia ninguém, só pra ser feliz. Que eu andei de cavalo na beira do mar, que eu fui 3 vezes aos desfiles de escola de samba no Rio. Conheci Salvador e lá tive o melhor encontro da minha vida: com minha liberdade e minha alegria. Que eu vivi uma história com um garoto skatista lindo passeando de mãos dadas nas areias de ipanema e ele nem virou um texto daqui. Ela também ia ter que saber que aquele medo de ter uma crise de pânico e não poder voltar pra casa imediatamente aconteceu, mas a gente não morreu não. A vida profissional é minúscula mas cada passo chego mais perto do meu caminho. 2022 foi de alegrias imensas, as maiores da vida. Mas também de confronto com uma apatia e vontade de morte que nunca conheci. E estou renascendo. Não tenho mais medo dos meus abismos porque eles moram em mim. Um dia de cada vez é a oração mais bonita do mundo. Mais uma vez inventei um romance para ver de novo brilho na vida mas finalmente aprendi a calar a boca. Levei as coisas boas na mala de mão e vazei. Cada dia que passa eu gosto mais de mim e eu queria voltar aqui pra dizer isso.

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Era para ser 15 dias


Quantas vezes morremos e renascemos numa mesma vida? Não sei. Mas me lembro com exatidão de como um dia de março de 2020, no meu lugar favorito do mundo, eu senti como se ali, talvez realmente completa pela primeira vez na vida, estivesse chegando ao fim uma temporada da minha vida - com final feliz. Onde eu estava realizando sonhos, encarando medos e acreditando que sim, o futuro viria e muitas vezes eu estaria sozinha, mas já tinha aprendido o caminho para meu próprio colo. 

Então veio a pandemia. Então as pessoas que eu admirava não se importavam tanto assim com o avô do próximo morrer. Então o homem que comanda o país debocha dos mortos e tudo certo. E eu, que sequer aguentava as férias ociosas sem ter uns pensamentos horríveis me vi largando emprego, formando e vendo a juventude sair pelo ralo. Eu sou privilegiada, eu posso ficar na cama chorando minhas incertezas. Mas o tempo não volta. Muita gente que eu amo está em sua própria batalha para não enlouquecer, mas muitas vezes pensar nisso não alivia o sentimento de ser a pessoa mais sozinha do mundo. Fazem 7 meses que eu não saio de casa, fora duas idas ao médico e umas 5 ao supermercado. Morri, não teve jeito. Abri mão da meu único orgulho em não pedir ajuda para o problema que sei que mais ninguém além de mim é capaz de resolver. E ainda tenho sonhos, mas hoje sei que a vida segue tranquilamente sem mim. Dormir entorpece a dor de não saber mais quem eu sou. Eu não interesso a ninguém e pensar nisso me dá até alívio. 

Migalhas de estrelas fantasiadas de libido. Mudei de terapia e dobrei a dose do remédio, o que ainda não descobri como fazer é renascer de novo. Um dia, um dia recomeço....

domingo, 27 de dezembro de 2020

Vinte vinte, um pouco de solidão e umas coisinhas soltas

 

"Você não é uma pessoa difícil de ser amada. Você está tentando." Foi isso que eu tive que me dizer quase todos os dias do ano da graça de 2020, onde o mundo inteiro está lutando para sobreviver, para não surtar, para não ir embora, para ter esperança. Eu tenho medo da tal maturidade me banhar pra sempre de amargura. Eu não amo mais ninguém. Eu me chamaria de doida - e como diz o Rosa, nessa casa (eu) ninguém diz a palavra doida - se me contassem no final de 2019 que eu me afastaria de tantas pessoas que naquele momento eram meu suporte, que eu colaria grau na faculdade por um computador, que eu estaria ganhando dinheiro com o que ando fazendo, que eu veria meus amigos um número de vezes que desse pra contar na mão. Que eu assumiria pra mim mesma, de uma vez por todas, que eu amo romance e isso seria a chave para parar de me sabotar tentando desesperadamente sentir algo por homens que claramente não me queriam, só porque sentir algo era melhor que não sentir nada. Seria loucura dizer da angústia e solidão que senti mas que eu estou viva, estou de pé. Seria impossível pensar que eu viveria o dia mais feliz da minha vida ao lado de uma amiga e meses depois eu veria essa amiga passar pela maior dor da sua vida sem eu poder lhe dar um abraço. Eu não amo mais ninguém porque de repente todo mundo virou egocêntrico e eu também virei. Eu tento tento tento e muitas vezes não consigo melhorar. Mas eu mereço ser amada. As piores crises desde 2012 apareceram e eu sobrevivi, mesmo tendo que encarar que essa sombra talvez me persiga pro resto da vida. Eu quero ser potência, ser rio que corre pro mar mas viver é difícil. Eu quero ser mais gentil comigo e com meus pais, quero ler, botar os pés no mar, me encontrar comigo. Quero me vacinar e poder sair sem medo da morte. Quero não pensar em nada que seja irracional. Quero sonhar grande e encontrar meu caminho. Quero ser abençoada pelo Deus que acredito e que acredita em mim. Quero dançar com a vida. Quero me amar.