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quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Cidade-presépio


Fui pela primeira vez em Ouro Preto aos 16 anos, num carnaval. Não tive tempo e nem espaço para conhecer nada cultural, afinal o carnaval da cidade é famoso pela agitação e as aglomerações. Mas foi o suficiente para me encantar e me prometer voltar um dia.
Apaixonada pela história como sempre fui, pra mim Ouro Preto é um destino cheio de minuciosidades para explorar. Desta vez, num contexto mais calmo - e lindo pois fui para comemorar um ano de namoro - tive tempo de ver tudo que eu queria.
Começo contando da aventura na estrada, pois é um dos meus grandes e tantos medos. Saindo de BH segurando a chuva no olho, fui. São 90km daqui até Ouro Preto, mas a eminencia de chuva, as curvas sinuosas e a neblina intensa me deixavam apavorada e certos momentos. Por sorte, tenho um namorado-amigo-companheiro que quase nunca perde a paciência com meus delírios negativos. Chegamos e fomos almoçar, a fome não nos deixou fazer muitas escolhas. E digamos que não foi uma das melhores.
Mas ao chegar na pousada, tudo foi compensado. Charmosa, aconchegante e confortável. Estávamos prontos para vivermos um final de semana de sonho e amor.
Tiramos algumas fotos pelo centro e fomos conhecer a Igreja Nossa Senhora do Carmo. Uma coisa que me deixou desapontada foi o fato de ser cobrado para entrar em quase todas as Igrejas. E então resolvemos pagar para conhecer só o Museu da Inconfidência, que não deixou a desejar.
O Museu fica na praça Tiradentes, tem sua construção imponente datada entre 1785 e 1855 para ser a Cadeia e Câmara de Vila Rica. 
Entre os objetos históricos, documentos - até a sentença de condenação de Tiradentes pela Rainha D.Maria I - obras incríveis de Aleijadinho, pinturas de Mestre Taíde e um mergulho no história de Minas e do Brasil, a explicação de uma historiadora me chamou a atenção. Eu, que havia aprendido nas aulas de literatura que Marília esperou seu poeta Dirceu a vida toda, depois de seu exílio na África, tive a minha história de amor e sofrimento descostruída pela professora que passeava no local.
Marília não só foi ao encontro de Dirceu na África, como teve um filho dele que deixou no Rio. Fica a dúvida de quem estava falando a verdade, meu professor ou ela. Segue um trecho do meu poema favorito de Tomás Antônio Gonzaga (Dirceu) para Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão (Marília) , ambos que depositam seus restos mortais no Museu.  
Lira II
Pintam, Marília, os Poetas
A um menino vendado,
Com uma aljava de setas,
Arco empunhado na mão;
Ligeiras asas nos ombros,
O tenro corpo despido,
E de Amor, ou de Cupido
São os nomes, que lhe dão.
Porém eu, Marília, nego,
Que assim seja Amor; pois ele
Nem é moço, nem é cego,
Nem setas, nem asas tem.
Ora pois, eu vou formar-lhe
Um retrato mais perfeito,
Que ele já feriu meu peito;
Por isso o conheço bem.
Os seus compridos cabelos,
Que sobre as costas ondeiam,
São que os de Apolo mais belos;
Mas de loura cor não são.
Têm a cor da negra noite;
E com o branco do rosto
Fazem, Marília, um composto
Da mais formosa união.
Tem redonda, e lisa testa,
Arqueadas sobrancelhas;
A voz meiga, a vista honesta,
E seus olhos são uns sóis.
Aqui vence Amor ao Céu,
Que no dia luminoso
O Céu tem um Sol formoso,
E o travesso Amor tem dois.
Na sua face mimosa,
Marília, estão misturadas
Purpúreas folhas de rosa,
Brancas folhas de jasmim.
Dos rubins mais preciosos
Os seus beiços são formados;
Os seus dentes delicados
São pedaços de marfim.
(...)
Tu, Marília, agora vendo
De Amor o lindo retrato,
Contigo estarás dizendo,
Que é este o retrato teu.
Sim, Marília, a cópia é tua,
Que Cupido é Deus suposto:
Se há Cupido, é só teu rosto,
Que ele foi quem me venceu.

Acho que prefiro acreditar na história da moça, um amor tão puro e bonito não devia ter acabado com uma moça-senhora esperando pelo amado a vida toda. Tomara que ela tenha ido mesmo a África.
Fomos ao festival de Jazz na UFOP, jantamos o melhor macarrão da minha vida na Rua Direita e terminamos a noite abraçados vendo o movimento da praça. A noite foi boa e pela manhã o café me surpreendeu: Minas é a terra da melhor comida do mundo! Pães de queijo, bolos, queijos, doces, sucos, frutas. E de novo para a rua conhecer mais coisas, tirar mais fotos e festejar o amor.
De tarde, por indicação do porteiro fofo da pousada, fomos conhecer o Parque das Andorinhas, e eu revigorei a alma. Quedas d'agua fresquinha e uma vista de perder o fôlego. Pena que não conseguimos chegar a cachoeira principal, fica pra próxima.
A noite se encerou com O Pianista no cineUFOP e mais um jantar delicioso.
Como é incrível conhecer lugares com quem a gente ama. Como é incrível se superar, se ver grande e feliz.

Gracias a la vida.




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